Início da Jornada

Depois que viramos mães e pais passamos por um “portal” que muda as lentes pelas quais enxergamos o mundo e, muitas vezes, queremos inclusive transforma-lo. A Maitê veio me dar a oportunidade de passar por esse tal portal e também por um outro. Ela me levou para o mundo da inclusão, o mundo das pessoas atípicas , mundo que eu achava conhecer bem por trabalhar com educação há tantos anos. Porém, dessa vez foi diferente, porque passei a vê-lo do lado de dentro.

Portanto, falar sobre a Maitê de peito aberto, não é apenas uma forma de dividir meus sentimentos, mas também uma maneira de plantar uma sementinha pelos quintais, praças, ruas e cidades pelas quais ela poderá brincar e passar.

Aprendi com a mãe de uma menininha que tem uma síndrome que causa má formação facial, que quanto mais falamos sobre nossas filhas atípicas, mais aproximamos as pessoas delas, porque, do contrário, estaremos as colocando na sombra do desconhecido, do estranho.

O que aconteceu com ela e também já aconteceu comigo, é que as crianças procuram sempre se aproximar, fazem perguntas, mas sempre um adulto muito preocupado corre para tirar a criança dali e pede desculpas pela “falta de educação”. Na verdade, as crianças são francas, elas fazem as perguntas que todos querem fazer, mas não tem coragem. Então, eu que nunca tinha parado para pensar nisso, coloquei essa outra lente que me fez enxergar a importância de aceitarmos e dividirmos. Para que todas as crianças, e adultos, aprendam a viver em um mundo em que se sintam confortáveis ao lado de pessoas diferentes.

Descobrimos que a Maitê tem uma síndrome rara, um micro pedaço do cromossomo 9 foi deletado, fazendo com que ela tenha uma série de sintomas decorrentes disso. Hipotonia (baixo tônus muscular), atraso da fala, atraso cognitivo e uma série de problemas de saúde (no nosso caso, a Maitê não apresenta nenhum desses problemas de saúde) como, problemas cardíacos, renais, respiratórios e etc. As crianças também podem apresentar espectro autista, problemas auditivos, ataques epiléticos e problemas para dormir. A síndrome é conhecida como Kleefstra, que é o nome da médica que catalogou essa alteração em 2002.

Saber desse diagnóstico foi devastador, descobrimos que 40% das pessoas podem ter problemas psiquiátricos e regressão na puberdade. Porém, depois do choque colocamos os pés no chão, levantamos as mangas e começamos a nos mobilizar para, buscar todas as informações existentes, contatar outras famílias que passam pelo mesmo, nos engajarmos pela busca dos melhores tratamentos e por uma maior conscientização da sociedade sobre essa síndrome tão desconhecida.

Nossa caminhada com a Maitê começou antes de ela ter 1 ano de idade, quando os sinais de atraso de desenvolvimento começaram a aparecer. Desde então ela faz fisioterapia, fono, natação e logo colocamos na escola. Com 1 ano ela não sentava sozinha e hoje ela está quase andando sem apoio, o ritmo dela é mais lento, mas ela sempre mostrou respostas positivas aos estímulos.

Na escola, esse ano, presenciamos um enorme salto. As suas professoras com o olhar muito atento e muito afetuoso, ouvem o que eu digo, percebem as individualidades dela, voltam com suas observações e, assim, vamos abrindo a trilha no meio da mata a caminho de um aprendizado em conjunto.

A Maitê que olhava para as outras crianças apenas como obstáculos pelo caminho, passou a ser mobilizada por elas, passou a reconhecer muitos desses amigos e, os amigos…ah os amigos…quão especiais são esses pequenos seres humanos tão doces e carinhosos? O que dizer de toda a demonstração de cuidados e afeto que todos eles têm por ela? Todos aprendem juntos. Eles aprendem a dar a mão para ajudá-la a entrar na roda, a ter paciência para esperar ela chegar onde precisa, a incentivar e a dar coragem. E a cada dia a Maitê se torna mais autônoma, mais corajosa, mais expressiva, mais inteligente, mais alegre …

Vai chegar o dia em que eles vão perguntar por que a Maitê não responde quando falam oi, não anda, não dá tchau, não bate palmas no parabéns, não fala, usa óculos …E então, temos que estar prontos para dizer que ela não responde, mas ela gosta muito quando falam oi para ela, que ela não anda, ainda, mas vai andar e a ajuda deles é muito importante, que ela não bate palmas, mas gosta muito estar na roda na hora da cantoria.

Com muito amor e otimismo vamos seguir em frente e quanto mais gente tivermos ao nosso lado, mais felizes seremos!

A organização Genespark.org está desenvolvendo uma medicação que pode chegar a reverter a deficiência intelectual dos pacientes com Kleefstra e outras síndromes. Clique aqui para saber como contribuir com a pesquisa.

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